Rafael Alcadipani 

Renato Sérgio de Lima

 

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo está passando por uma crise de dimensões históricas. A pasta está conseguindo criar arestas com as duas Polícias concomitantemente.

No caso da Polícia Militar, houve a substituição de muitos coronéis de forma atabalhoada e sem o devido cuidado com os ritos da instituição. Além disso, há relatos da interferência direta da Secretaria na promoção de oficiais, sem falar na adoção de um discurso que incentiva a truculência por parte de tropa e que causa importantes danos institucionais para a imagem da PM perante a sociedade.

No caso da Polícia Civil, o governo desprestigiou a instituição no momento dos aumentos de salários, está supostamente retirando atribuições da polícia de investigação e passando para a polícia ostensiva sem a construção de um diálogo e de um consenso a respeito do assunto. Por fim, a Polícia Civil enfrenta uma grande falta de efetivo e o governo não foi se quer capaz de nomear candidatos aprovados em concurso. Especula-se, ainda, que o Palácio dos Bandeirantes decidiu não convocar o número adequado de remanescentes de concursos públicos, a despeito da urgente necessidade. O discurso está contraditório com a prática.

A crise é ainda aprofundada por posicionamentos públicos da Secretaria de Segurança enaltecendo ocorrências com resultado morte e deixando patente um claro uso político da imagem das instituições policiais para gerar votos a futuros candidatos. É preciso destacar ainda que muitos dos quadros escolhidos pelo secretário para assessorá-lo são de pessoas com extremo pendor ideológico e corporativista.

O resultado é que está se aprofundando um racha entre a Secretaria e partes importantes das instituições policiais de São Paulo ao mesmo tempo em que a Secretaria parece incentivar a disputa corporativa entre a Polícia Civil e a Polícia Militar. Nas duas Polícias, há relatos da Secretaria ter feito ingerências poucas vezes vista em São Paulo. Ao mesmo tempo, a gestão da pasta, às vezes, parece mais preocupada em criar conteúdo para “lacrar” na mídia social do que na melhoria efetiva das condições de trabalho dos policiais e do controle da criminalidade.

Vemos em São Paulo cenas típicas do Rio de Janeiro como “balas perdidas” que atingem mulheres e crianças. Um dos fatores que causa este tipo de ação é não incentivar o profissionalismo dos policiais e sim o “tiro, porrada e bomba”. Não por acaso, pesquisas de opinião divulgadas na semana passada dão conta de que a população de São Paulo não está satisfeita com os rumos da segurança no estado.

Gerir a Secretaria de Segurança Pública buscando ter uma postura sóbria e serena ao mesmo tempo em que se estimula a coesão interna e externa das polícias entre elas e a sociedade já é bastante difícil. Quando a postura adotada é de criar celeumas, disputas e conflitos a tarefa fica impossível. Segurança Pública precisa ser gerida com sobriedade, discrição e maturidade. As culturas e os ritos das polícias precisam ser preservados e a Secretaria não pode fomentar rinhas institucionais. O enfrentamento ao crime requer profissionalismo, harmonia e cooperação, jamais disputas.

O governador foi eleito com uma grande esperança dos eleitores de que ele iria melhorar a situação da segurança em São Paulo. Os rumos adotados até aqui mostram que seu governo está perdido no tema.

*Este texto não reflete necessariamente as opiniões do Gestão, Política & Sociedade.

Sobre os autores:

Rafael Alcadipani é Professor Titular da FGV EAESP e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Renato Sérgio de Lima é Diretor-Presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e Professor da FGV EAESP